terça-feira, 20 de julho de 2010

Viagem na carroça do tempo que passa

A carroça parecia-me imensa. As rodas eram mais altas que eu.
Já existiam algumas com rodas de automóvel mas o meu avô
nunca se rendeu a essas modernices. Depois de um pequeno almoço
madrugador e com o gosto do toucinho da arca de sal ainda nos
lábios, lá íamos nós pela estrada de terra. Íamos à vila.
Na altura "ir à vila" era uma expedição.
Os solavancos faziam-me saltar o traseiro do banco espartano
e não fosse eu agarra-me com força aos ferros da carroça, o meu
avô perdia o passageiro. O veículo guinchava com umas sacudidelas
laterais e convinha ter a cabeça bem presa aos ombros. Quando
finalmente chegávamos à estrada alcatroada, a tareia tornava-se
mais branda. Que orgulho eu tinha então, sentado no meu banco
de tortura, quando entrávamos na cidade. Nenhum carro de
luxo me faria sentir esse orgulho hoje. São experiências que
desapareceram do meu mundo, muitas mais irão desaparecer.
Era uma vida sem pressas. Por vezes penso que um dia deixarei
a cidade e voltarei para o campo antes que seja tarde de mais;
Antes que tudo o que caracterizava o genuíno do nosso país seja
modernizado, normalizado, desinfectado e globalizado.
Antes que comecemos a comer queijos saloios vindos
da China.