quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A solidão do embrulhador de prendas de Natal


Esta manhã quando visitei um hipermercado para adiantar já
algumas prendas de Natal, assisti a uma cena digna de um
romance de Leslie Charteris. Depois de me proporcionar uns
quantos metros de papel de embrulhar, a empregada informa-me
que este ano, são os próprios consumidores que têm de fazer
os seus próprios embrulhos. Foi-me assim indicado um local
subterrâneo junto ao parque automóvel onde eu poderia utilizar
fitas e papel fora da área de venda. Estava lá uma mesa grande
com tesouras presas por correntes e distribuidores de fita-cola
atarraxados ao tampo. Esses detalhes ampliados pelo efeito
da luz de néon, davam ao local um vago ar de ilegitimidade àquela
cena. Apareceram mais duas senhoras e um cavalheiro, já com
os seus papéis de embrulho ainda enrolados debaixo do braço,
e toca de embrulhar prendas. Na minha mente, comecei a idear
uma história sombria; Aquela gente, meio envergonhada vai-se
lá saber porquê, parecia estar a fazer algo de ilícito, naquela parque
de estacionamento de um hipermercado. Inserida num filme
de espionagem, aquela cena poderia parecer um bando de insurrectos
a fabricar bombas explosivas ou a manusear componentes para
drogas. É claro que a expressão facial dos "embrulhadores" dizia outra
coisa: dizia que estavam felizes pela alegria que iam causar aos seus
entes queridos. Para utilizar a bonita expressão de Quino em "Mafalda",
pareciam "terroristas da felicidade".
Penso que o ar meio-envergonhado das pessoas naquele momento,
era devido ao facto de estarem elas próprias a embrulhar as suas
prendas pelo facto de o hipermercado não querer pagar a empregadas
extras que poderiam fazer esse serviço. Claro que aquilo não era
o Harrod's, mas mesmo assim acho que "algo está podre neste reino",
(para parafrasear o escritor português Chico Espirro.)